Reforma da Previdência não trará mais investimentos
Acesso à escolas de qualidade, pleno atendimento da saúde pública, ruas sem buracos, transporte público para todos e espaços públicos com boa zeladoria. A cidade que todos queremos e sonhamos é apresentada pela prefeitura de São Paulo com um gargalo ou uma dificuldade atribuída a um problema estrutural que seria gerado pela previdência dos servidores públicos municipais.
A ‘bala de prata’ para a retomada do investimento público é a ‘reforma da previdência municipal’. Servidores que defendem a manutenção de seus ‘privilégios’ ‘atrapalham a cidade e seus cidadãos’.
É tentador para o cidadão o cenário colocado e a solução proposta. Porém a análise real dos dados e as opiniões de especialistas, juntamente com um olhar para experiências já vividas, demonstram que esse caminho não se sustenta.
Diante de uma tentativa de rápida aprovação, do Projeto de Lei 621/16 que estabelecia o aumento da contribuição e a reestruturação de todo o sistema de aposentadoria dos servidores, em março deste ano, mais de 100 mil servidores públicos conquistaram para a cidade a oportunidade de conhecer mais sobre a proposta do governo municipal e ampliar seu debate.
Hoje, graças às manifestações, a Câmara Municipal discute com especialistas e servidores a situação do sistema e suas soluções através da Comissão Especial de Estudo da Sampaprev (como ficou conhecido o projeto), da qual faço parte.
Na Comissão foram apresentados, por exemplo, erros de cálculos do projeto original, superestimação das despesas e subestimação das receitas, segundo estudo apresentado pela CTEO (Consultoria Técnica de Economia e Orçamento), da Câmara Municipal de São Paulo.
Foram recebidos especialistas, como o renomado professor Wagner Balera, que afirmou que o projeto possui diversos erros materiais em seu texto, e ouvidas afirmações, como de professora Érica Cristina Rocha Gorga, sobre haver problemas de governança nos Fundos de Previdência Complementares, dos quais levaram à escândalos de corrupção, como revelados pela Operação Lava Jato e Operação Greenfield.
Porém, o mais importante dos pontos levantados pela Comissão foi que a chamada “bala de prata” para a gestão fiscal municipal não se sustenta. Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos principais índices para retratar a situação fiscal de um ente é a relação de gastos com pessoal e Receitas Correntes Líquidas.
Olhando para São Paulo, em 2016 esse percentual foi de cerca 38%, caindo para 36% em 2017 e mantendo em tendência de queda em 2018. É a menor relação dentro de todas as capitais e Estados. Não há descontrole fiscal motivado pelo pagamento dos servidores municipais ativos e inativos.
Ainda no ponto da gestão fiscal, a aprovação do Projeto de Lei 621/16 levaria a uma piora dos números do orçamento da Prefeitura. Segundo o estudo apresentado pela CTEO, “o cenário com a segmentação apresenta custo mais elevado no curto e médio prazo, atingindo um custo adicional máximo em relação à situação atual de cerca de R$ 2,9 bilhões em 2039.
Nos próximos 10 anos, o custo seria em média R$ 646 milhões maior à situação atual. Somente a partir de 2048, o custo do regime com a segmentação torna-se menor do que o cenário sem reforma”. Esse cenário pode levar à total paralisação dos investimentos e piora dos serviços públicos. Isso não atende aos anseios da cidade e da gestão fiscal responsável.
A experiência de outros entes, trazidos ao conhecimento da Comissão pela advogada Fátima Castanheira, demonstra que a segregação de massas levou ao aumento da insuficiência de seus sistemas previdenciários.
Além disso, diversos pontos específicos das aposentadorias dos servidores públicos já foram reformados em nível federal, como direito à integralidade (valor de aposentadoria igual ao último salário) e à paridade (mesmo nível de reajustes dos ativos para os inativos). Neste momento o novo governo discute a aprovação de mais alterações ainda no primeiro semestre de 2019. Isso altera o cenário de números do projeto do governo.
É necessário maior tempo de debate para aprofundamento do tema. No nível federal, essa discussão tem durado anos, passando por diversos governos. A cidade tem o direito de conhecer a proposta da Câmara Municipal para a questão previdenciária, bem como necessita de mais investimentos públicos e deve fazer escolhas sobre as prioridades para os próximos anos.
A Câmara de São Paulo não pode jogar fora essa oportunidade e forçar uma aprovação de um tema dessa relevância na semana entre o Natal e o Ano Novo. Uma decisão sem todos os dados e sem o tempo necessário poderá trazer consequências ruins, não apenas para os servidores públicos contrários ao projeto, como eu, mas para o futuro fiscal da cidade.